Tic-Tac


Dez e meia da manhã. Onze anos de vida.
O ponteiro não para de avançar e uns valentões da sala querem me bater de novo. Não entendo por que alguém sempre quer me bater.
Dessa vez foi de graça e como a maioria das brigas na escola a situação começou na aula de educação física. Ninguém entre os garotos gosta muito de mim por eu ser diferente do resto. Para meu azar nasci loiro e apesar das meninas da sala gostarem bastante, os garotos não gostam nada. Eu já tinha sido ameaçado algumas vezes e seguindo os conselhos de minha mãe, corri. Se ela soubesse como é difícil evitar uma briga na escola onde estudo teria me ensinado a bater em vez de correr. Ou me mudado de escola...
Todo intervalo é a mesma coisa. Desde o pré, só consigo comer se ficar escondido. Por sorte uma das tias que faz a merenda me deixa entrar e comer na cozinha. Mesmo assim eu ainda preciso chegar até lá. Ninguém gosta muito de mim na classe, tenho fama de bobo. Acho que eu sou mesmo. Não consigo ser mau como os outros garotos que resolvem tudo na pancada. Uns dias atrás pegaram um dos garotos novos... Bem mais forte que eu até. Bateram muito nele e enquanto batiam, olhavam pra mim dizendo que eu seria o próximo. Esses garotos são maus de verdade. Já quebraram o braço de um garoto de quinze anos; todos juntos é claro. Eles têm uma ganguezinha. Acho que é esse o nome que meu pai dá quando um monte de gente baderneira arruma confusão com as pessoas.
Os que me perseguem são três garotos (além de meu pai, mas ele só me persegue em casa me assustando com seus gritos...). Às vezes prefiro a escola.
Um dos garotos que quer me pegar tem uma bota com bico de aço, ele vive chutando as portas da sala dizendo que está louco pra estrear a bota na cara de alguém. O outro é um grandalhão, é o maior menino da classe e tem raiva nos olhos. Quem sempre atiça essas brigas é o baixinho metido a besta de bota de aço. O outro doa valentões é o Dú. Ele é filho de uma inspetora de alunos da escola e é meio besta. Acho que tem algum tipo de atraso na cabeça. Os meninos não são ruins a não ser o baixinho que não aguentaria nada não fosse apoiado pela força dos outros. Não entendo por que os garotos ficam defendendo ele. Talvez pelo fato do pai dele ser dono de metade da cidade.
O ponteiro agora marca onze horas da manhã e a cada dez minutos chega uma cartinha para mim. A primeira que chegou as nove dizia: “Vamos te quebrar na saída”. Meu coração pula forte no peito porque por mais corajoso que eu pudesse ser — e não sou — não gostaria de enfrentar três ou quatro garotos que já quebraram o braço de outro menino bem maior que eu. Às dez da manhã recebi outra. Essa continha um desenho com um garoto com meu nome na camiseta caído no chão com cruzinhas de morto nos olhos, como nos desenhos da TV. Ao meu lado no desenho tinha um monte de xingamentos escritos. Coisas como bichinha, boyzinho e filhinho de papai. Eu nem sei o que é boyzinho direito.
Algumas meninas da sala ficaram sabendo da briga e colocavam mais lenha na fogueira inventando e fofocando coisas que nenhum dos dois lados tinha dito. O garoto grandalhão olha pra mim toda vez que eu olho pra trás e faz sinal que vai me bater com as mãos. As meninas riem de mim sem parar. Todas elas inclusive a garota que eu mais gosto. Não sei o que fazer. Meu coração está disparado e por mais que eu tente me controlar acho que não vou conseguir. Preciso ir embora daqui antes que caia no choro. Quero minha mãe e o meu mundo melhor de casa. O mundo fora dos portões é um lugar estranho e não vou ficar esperando para apanhar dos outros.
— Professora?
— Sim, pode falar — ela responde.
— Preciso ir no banheiro, não tô me sentindo bem.
— O que foi? — diz a professora se aproximando de mim colocando a mão na minha testa. Estou suado de medo, mas ela acha que é suor frio de febre. Melhor assim. — Vai até a diretoria e pede pra ligarem para alguém.
— Tá bom. — Dito isso eu saio da sala vendo os meninos com mais raiva ainda por eu ter escapado da surra.
Me saio bem na diretoria dizendo que tive febre à noite e preciso descansar um pouco. Em casa contei pra minha mãe que a professora dispensou todo mundo depois de uma prova surpresa — ela acredita afinal não costumo mentir pra ela. Fico com um pouco de culpa por causa da mentira, mas o que eu deviria ter feito? Apanhado dos garotos? Pra quê? Por que eu preciso apanhar?  É assim que viramos adultos? E outra: eu não iria mesmo contar que saí correndo dos garotos. Meu pai me acha muito valente e não quero perder a admiração dele. Ele não me dá muito valor e se eu contar a verdade pra ele ou pra minha mãe perco o que sobra de carinho dos dois. Meu pai sempre diz que tem vergonha dos caras que levam a pior no Boxe. Às vezes eu assisto com ele. Ele é bravo como o tal do Mike Tyson. Eu quero ser como ele, mas não sou. Eu sou um merdinha como ele sempre diz.
— Filho; estranho a professora liberar vocês... A diretora sabe que você veio embora?
Droga, ela percebeu. Ela é esperta e me conhece bem. Além de também conhecer a diretora da escola que vai acabar perguntando alguma coisa. Se eu falar que estava doente vai me levar no médico. Pensa moleque; pensa...
— Dor de barriga, mãe. Eu tava com dor de barriga e fiquei com vergonha de te contar.
— Vem cá, filho — ela diz e me dá um abraço forte como se eu fosse mais adulto em poupá-la de minha dor de barriga. — Não precisa ter vergonha de mim. Pode contar essas coisas pra mamãe viu? Mãe serve pra essas coisas.
Eu tive vontade de dizer a verdade já que ela estava tão doce, mas talvez ela não gostasse de ser enganada no mesmo assunto duas vezes. Ah, é bom estar em casa onde ninguém me bate. Às vezes meu pai me bate, mas só quando o dia dele é muito ruim e apanhar do pai não é vergonhoso. Prefiro isso a ter que encarar os grandalhões da minha classe. Os moleques pegam pesado comigo e minha última esperança de crescer é me livrar disso.

***

Aqui estou eu de novo.
Novo dia de onze anos. Um dia depois de afinar pela terceira vez da briga com os garotos malvados da sala. A diretora começou a desconfiar que tenho algum problema sério de saúde já que todos os dias eu preciso sair mais cedo com febre ou caganeira. Tenho vergonha, mas é melhor ter vergonha e todos os dentes do que perder a vergonha e dois centroavantes.
Hoje logo que entrei na sala começaram a imitar uma galinha. Eu disfarcei, mas sabia que era comigo. Não entendo o prazer doente que os outros garotos têm de arrebentar comigo. Um pouco mais cedo eles me cercaram dentro da sala, me arrastaram para os fundos e ficaram me empurrando de um para o outro. Eu parecia aqueles bonecos “João Bobo” que as pessoas socam e esperam voltar. Me senti um João Bobo indo de um lado pro outro sem reagir. Os garotos riram e as garotas da sala — até as que dizem que sou bonito — acompanharam as gargalhadas. Um dos meninos que até então me tratava com algum respeito se uniu ao bando e cuspiu em minha cara. Até ele?, eu pensei. Sim; até ele. Quando você nasce espanador não deve achar que pode ser dono do galinheiro. Não mesmo.
Por sorte a professora chega e me tira antes que alguém bata em mim de verdade. Nesse dia estou de sapatos novos. Tênis na verdade que eram brancos antes das pisadas dos meus perseguidores. Comporto-me como Jesus quando os soldados romanos além de espancá-lo deram risadas dele. Ser fraco é uma bosta. Sou fraco por dentro e não só por fora e isso é verdade. Eu sei que sou um covarde ou não deixaria que falassem comigo daquela maneira. Já pensei que meu pai fosse cagão também e que eu talvez tivesse puxado a ele. Antes fosse isso. Eu sei que o chefe dele fala o quer pro meu pai que acaba aceitando o saco de lixo que ele joga na sua cabeça, minha mãe fala essas coisas com ele e eu escuto. Acho que ele não deveria aceitar isso e eu também não. Meu pai pelo menos tem fama de mau na família. Todo mundo tem um pouco de medo dele e da fama de “equina” que conquistou. Queria que ele fosse valente assim com o chefe que caga na cabeça dele, mas isso não acontece. Acho que deve ser bem fácil esculachar a família ao chefe que te dá dinheiro.
Pensei em dar dinheiro para que os garotos me deixassem em paz. Até dei a eles algumas vezes, mas enquanto eu pagava uns; outros pediam mais para não me bater e eu não tenho dinheiro para subornar a escola inteira. Quero ter ainda. Quem tem dinheiro tem respeito e acho que por isso o baixinho da sala que tem bota de bico de aço tem o respeito dos outros. O pai dele tem grana. Bem mais que o meu. E o pai dele é bravo também, todo mundo na cidade tem medo dele. Sinto inveja.
A professora começa a aula e eu já tento ensaiar alguma doença para escapar da promessa de surra. Aula é de história. Gosto da matéria e quando sei alguma das perguntas da professora acabo respondendo. O pessoal do fundo da sala não gosta e começa a me xingar de novo.
“É um puxa-saco mesmo” — alguém diz quando acerto a segunda pergunta, todo mundo ri inclusive a professora. Até ela me faz de idiota. Penso que poderia pegar o revolver do meu pai e acertar as contas com o resto dos garotos, acho que devia mesmo fazer isso. Um belo banho de sangue e duvido muito que tivessem coragem de me perseguir ainda. Podia até ir para a Febem onde meu pai diz que maus garotos vão, mas duvido que na Febem eu apanhe tanto quanto na escola; ainda mais se tiver matado outro garoto antes de ir pra lá. O sangue te dá respeito eu acho. Comecei a pensar essas coisas de uns tempos para cá.
Quem eu quero enganar com isso.
Eu não sou um matador de garotos. Minha mãe sempre disse que matar e roubar são os pecados de verdade. Os outros são coisas de árabe...
Me esforço para ficar calado e não responder mais as perguntas da professora e, apesar de ser difícil, — eu sei quase todas as respostas, na sala ninguém parece estudar — me controlo e finjo ser um imbecil.
A sirene toca e resolvo ficar na sala com a desculpa de estudar. A professora logo percebe, mas decide me deixar em paz. Os outros garotos ficam na porta fazendo sinal que vão me pegar na saída. Se vou apanhar de qualquer jeito, que seja o mais tarde possível. Eu ainda posso fingir outra doença qualquer e ir embora. Sim! Eu sempre vou poder fazer isso e ninguém vai dizer que não estou doente. Só posso ser pego na mentira se for dia de vacinação quando o médico vem na escola. Por sorte ele só vem a cada seis meses.
É bom demais ficar sozinho durante o recreio sem ninguém pra me dar pancada, roubar minhas coisas ou rir de mim.
Como não tenho nada pra fazer começo a desenhar a primeira coisa que me vem à cabeça no caderno. É uma caveira com raiva. Seus olhos pegam fogo. Parece com aquelas caveiras que tem nos vidros de veneno, mas a minha tem mais raiva. Ela sangra também, pelos olhos e pela boca. Desenho ela em cima de uma bandeja que está também cheia de sangue. Sangue para todos os lados. Nunca soube desenhar muito bem — ou fazer qualquer outra coisa bem feita, assim diz meu pai — mas me saio bem com as caveiras. O tic-tac do relógio anda rápido e por mais que eu tente frear o tempo como no filme que eu vi na TV o relógio não obedece. A sirene vai tocar em cinco minutos e meus perseguidores vão voltar pra sala. Eu rezo pra que caia uma bomba antes do sinal tocar. A bomba não vem e a sirene termina seu escândalo.
Incrivelmente ninguém me provoca e penso ter escapado, vai ver desistiram de bater num covarde feito eu. Mas tem alguma coisa errada... Eles passam o resto da aula combinando alguma coisa. Sei que o assunto sou eu... Vem o sinal da saída, a velha sirene que me deixa maluco berra enlouquecida. Todos ficam felizes em ir para casa, mas quem ficaria feliz em apanhar na saída?
Antes que eu consiga sair da sala e evaporar minha KKK sai junto combinando alguma coisa contra mim. Eu sei que é isso, porque enquanto conversam, Jefinho olha pra mim fazendo o sinal que me põe medo — batendo uma mão na outra. Saio da sala bem devagar esperando que algum desastre natural me tire da situação ameaçadora.  O terremoto não vem e estou quase chegando ao portão. Passos cada vez mais curtos me protegem da rua.
— Não vai lá, não... Estão te esperando, são mais de oito caras — entrega um dos garotos quietos da sala. Nunca achei que ele fosse legal.
Eu volto correndo sem dizer obrigado. Vou direto para a sala da diretora.
— Preciso falar com a dona Celine — digo à secretária que parece sempre estar fazendo as unhas. Ela gosta de mim e sempre diz que sou seu pequeno príncipe. Eu não sei quem é ele, mas duvido que apanhe na escola.
— Pode entrar. Ela tá desocupada.
O cheiro inconfundível de café e cigarros da diretoria me faz sentir bem. Não deve ser comum crianças gostarem tanto da diretoria, mas esse é o único lugar seguro da escola pra mim. Ninguém pode me machucar lá dentro, tudo o que eu quero é não ter mais que fugir.
— Olá, garoto, quê foi? Doente de novo?
Penso que ela sabe de alguma coisa. As notícias se espalham rápido na escola.
— Não estou me sentindo bem de novo.
— Mas já o sinal já tocou. Pode ir embora.
— A senhora não pode ligar pra minha mãe vir me pegar? — Faço minha melhor cara de coitadinho pra ela. Estou ficando bom nisso e quem sabe me torne um ator? Isso se sobreviver à quinta-série...
— O quê tá acontecendo com você? Você sempre foi um garoto forte e agora aparece doente na diretoria quase todo dia. Que foi garoto?
— Nada. Só me sinto mal.
Eu não diria a verdade para a diretora. Se ela soubesse que ando correndo dos garotos faria uma reunião com seus pais e todos acabariam de castigo. A punição acabaria cedo ou tarde e eles voltariam mais raivosos que antes para acertar as contas. Ninguém quer comprar uma briga dessas pelo filho dos outros. Disso eu sabia com meus onze anos.
Finalmente Dona Celine disca os seis números que vão me proteger da surra.
— Alô? Dona Poliana?... Aqui é Celine; diretora da escola do seu filho.
Ela para de falar; acho que minha mãe esta perguntando alguma coisa.
— Não, não; está tudo bem. O seu menino não está bem de novo e pediu para que viesse buscá-lo.
Mais silêncio da diretora.  O que será que elas estão falando? Podem estar analisando os fatos. É questão de tempo a descobrirem o que está acontecendo de verdade — se é que já não sabem.
— Fique sossegada, cedo ou tarde as coisas melhoram. Garotos ficam doentes mesmo, é coisa normal nessa fase de crescimento. Até logo. Melhoras pra vocês.
Parece que deu tudo certo afinal.
— Vem comigo que te levo até o portão — diz o anjo nos meus ombros Dona Celine.
Nesse momento tive certeza que a diretora sabia o que acontecia dentro se suas salas de aula. Fiquei feliz por ela me ajudar, mas muito mais triste por saber que ela sabia de tudo — dos lanches roubados, das perseguições e espancamentos — e nada fazia contra os agressores. Os adultos são estranhos mesmo.
Enquanto atravessávamos os corredores da escola alguns espiões de meus inimigos corriam para fora dando informações aos outros garotos. Calculo que nem mesmo a diretora pode me proteger dos bandidinhos. Já dá pra ver o portão da escola e sinto que a qualquer momento vou encher minha cueca de medo. Tem muita gente no portão. Já passou quase meia-hora do toque do sinal e eu sei que o pessoal corre rápido pra fora da escola depois disso. Eles espalharam para todo mundo que teria briga. Briga feia. Ao atravessar o portão grande e azul meus temores se realizam: os garotos estão mesmo me esperando.
Alguns levam pedaços de pau como o baixinho de bota de aço, outros pedras nas mãos, alguns estavam sem camisa e todos me olhavam com raiva. Minha vontade era ir até lá e perguntar por que tinham tanta raiva de mim. Eu não me lembro de ter feito nada contra eles nem nada que pudesse irritá-los. O que percebi é que se tivesse deixado que me batessem da primeira vez teria apanhado de menos gente.
— O que estão fazendo aqui ainda? — gritou a diretora sem ter resposta. Tudo estava quieto e nem o vento fazia barulho.
— Vão embora ou vou ligar para o pai de vocês. E ainda vou mandar uma cartinha para o pai de cada um.
Disso todos os garotos tinham medo. Receber uma cartinha de dona Celine significava problemas sérios e provavelmente um esculacho na reunião de “Pais e Mestres” que acontecia uma vez por mês. O valentão da turma foi quem respondeu com uma desculpa esperta.
— Vamos jogar Taco. Vem jogar com a gente — ele me chamou.
Esperto, muito esperto. Mas eu também sou esperto e respondo com minha desculpa irrepreensível.
— Tô doente. Minha mãe vem me pegar.
Os garotos olham uns para os outros com diversão e raiva. Para garotos como eu, humilhar alguém como eu estava sendo agarrado à saia da diretora já seria o bastante. Para meus algozes não... Eles queriam meu sangue. Queriam descontar em mim a raiva que tinham guardado no peito. Minha incapacidade em entender a maldade deles me condenava a correr mais ainda. Como entender que crianças tenham raiva de alguma coisa? Crianças como eu? Eu não tinha raiva de ninguém até me apresentarem a escola. Depois comecei a ter raiva de quem me batia. Agora tenho raiva da diretora que deixa os bandidos dominarem seus banheiros; tenho raiva do meu pai que me obriga a estudar naquela escola onde todos querem me ralar a cara no chão.
Os garotos continuam esperando que eu vacile ou que minha mãe não venha em meu socorro. Eles não conhecem minha mãe, ela nunca faria isso. Ela é especial.
Ali vem ela. Andando rápido com seu um metro de sessenta de pura valentia. Minha mãe é uma leoa. Meu pai também é valente — menos com o chefe — e eu sendo um bobalhão não sei a quem puxei. Devo ter algum parente cagão... Só pode ser isso. Minha mãe olha pra mim com doçura e nota os garotos cercando a porta da escola. Ela percebe que estou agarrado na diretora como faço com ela quando me assusto. Não dá pra enganar a mãe da gente. Não na quinta-série. Ela me arrasta dali para a segurança da minha casa dizendo muito pouco.
Escuto alguma coisa me tirando do caminho e de minha mãe.

“Um, dois, três; acorda!”

Eu estou em outro lugar. Parece um hospital. Estou amarrado e confuso e vejo um pendulo na mão de um cara de branco. Tem outro cara de terno escuro. Ainda estou confuso.

— E então, Doutor? Louco ou bandido?
— Nenhum nem outro.
— Como assim?
— Trauma. Esse coitado apanhou muito quando era garoto. Outros garotos o perseguiam. Depois adultos. Nessa sessão de hoje ele escapou das surras, mas das outras quinze vezes até agora não. Ele deve ter apanhado muito. Olha essas cicatrizes. Devem ter arrebentado com ele. Usa olho de vidro tá vendo? 
— Mas o cara esperou vinte anos pra se vingar e matar meio-mundo?
— Tem copo que enche rápido, tem copo que demora... Esse cara aí? Teve um balde pra encher.
— Continua com a hipnose que eu quero terminar isso hoje, Doutor.
— Ok. — Atenção. De novo aqui amigo... Olha o pêndulo... Com sono... Um, dois, três; com sono, cansado e dorme.

Aqui estou eu de novo. Caído na calçada e cheio de sangue na boca.
Tenho doze anos, o braço quebrado e um corte fundo no olho esquerdo.
Tudo em mim dói...

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